Revolucionar a infraestrutura das cidades a partir da adoção de uma economia verdadeiramente circular é a principal missão da Biogenix, startup que desenvolve soluções para o desenvolvimento sustentável, como sequestro de carbono e redução da emissão de gases, ao transformar resíduos orgânicos (industriais e municipais) em fertilizantes especiais.
A empresa é uma das startups que integra o SNASH, novo hub de agtechs e edutechs criado pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA). Conforme explica o co-fundador e COO da empresa, Cássio Piccinini, a ideia de criar a Biogenix surgiu da ideologia de deixar uma marca positiva no mundo, resolvendo grandes problemas que as pessoas não estavam prestando atenção.
“Há alguns anos me deparei com muitos estudos sobre a ineficiência da cadeia de produção de alimentos globais e sobre os impactos do aquecimento global, o que simplesmente me marcou. Quanto mais eu estudava, mais obcecado me tornava por estes temas”, lembra.
Ao buscar problemas/soluções no mercado de sustentabilidade e sequestro de carbono, ele relata que conheceu um produtor de bambu em grande escala. E, por saber da eficiência da planta no sequestro de carbono, o incentivou a produzir carvão ativado, a partir da planta, para comercializá-lo para diversas indústrias como cosméticos e para o tratamento de efluentes.
Posteriormente, para dar suporte ao produtor de bambu no projeto do carvão ativado, Piccinini foi ao mercado procurar um profissional para tentar unir soluções sustentáveis em um novo projeto. “Então, conheci meu sócio e mentor, Osvaldo Schmitt, que, à época, trabalhava em um negócio de nanotecnologia”, recorda.
De olho no saneamento
Ao discutir sobre soluções sustentáveis para o mercado, ambos começaram a olhar para o setor de saneamento. “Com o marco do saneamento em voga, vimos que a entrada da iniciativa privada no setor seria imprescindível aumentar a eficiência, reduzir custos, agregar tecnologia e claro, reduzir as emissões de CO2eq”, diz.
“Em 2022, a indústria de saneamento global foi responsável por pelo menos 3.3% das emissões globais. E isso sim é um grande problema a ser resolvido”, acrescenta.
Com esse grande desafios nas mãos, ele buscou, com contatos no mercado, quais eram os principais gargalos e desafios da indústria de saneamento. Assim, chegou ao lodo, um subproduto das estações de tratamento de água e esgoto.
“O lodo é um passivo financeiro para empresas de saneamento e um passivo ambiental, porque grande parte desse resíduo é irregularmente devolvido aos corpos d’água ou despejado em aterros sanitários, onde segue emitindo gases de efeito estufa, como metano e outros”, analisa.
Nessa ocasião, a Biogenix começava a tomar forma, mas ainda faltava a última peça do quebra-cabeça: qual solução oferecer ao mercado. “Então, surgiu Regina Lana, uma das mais proeminentes pesquisadoras e engenheiras agrônomas brasileiras que conduzia um estudo completo sobre a utilização do lodo como insumo para produção de fertilizantes especiais”, lembra.
Atualmente, Regina é uma das sócias da Biogenix e será responsável por fechar o ciclo sustentável da empresa: transformar resíduos orgânicos em fertilizantes especiais focados nas principais culturas no Brasil e no mundo, sequestrando CO2eq do lodo e transformando-o em um produto de alta demanda que será colocado no solo para neutralizar as emissões por muito tempo.
Soluções
De acordo com o executivo, o principal objetivo da Biogenix é revolucionar a infraestrutura das cidades a partir da adoção de uma economia verdadeiramente circular, com uma solução que se se insere no processo de saneamento e coleta/tratamento de resíduos.
“A partir disso, viabilizamos algumas soluções, como produção de fertilizantes especiais que sequestram carbono e o neutralizam no solo, geração de crédito de carbono, compensação de emissões, geração de energia renovável e geração de energia verde, como hidrogênio e biometano”, elenca.
“A solução, de forma completa, deve atender 10 dos 17 objetivos de Desenvolvimento Sustentável propostos pela Organização das Nações Unidas (ONU)”, ressalta.
Propostas
Dentre as propostas da empresa, ele menciona um fertilizante de qualidade superior, em termos nutricionais, que oferece os principais nutrientes que a planta precisa. “O produtor rural economiza em irrigação, utiliza menos fertilizante por hectare, além de substitui por completo os fertilizantes minerais (produzidos a partir de insumos da indústria de óleo e gás principalmente)”, enumera as vantagens.
Já em relação aos resíduos, é oferecida uma solução de Plantas Modulares e escaláveis que podem, em apenas 12 meses, ser instalada em qualquer região próxima à geração do resíduo e operar na produção de energia e biochar (carvão vegetal quando é empregado como correção para o solo).
“A partir de um processo chamado de pirólise, o resíduo é colocado em um reator e levado a altas temperaturas de forma controlada. No final do processo, teremos o biochar, hoje considerado a melhor solução para sequestro e neutralização de CO2eq globalmente”, avalia.
Ele lembra que o valor da tonelada de biochar, produzida a partir do processo de pirólise, pode compensar até 2 toneladas de CO2eq emitidos por outras indústrias. “Imagine esse número em escala nacional!”
Segundo Piccinini, durante o processo de pirólise, é possível gerar e sequestrar grande quantidade de biometano e amônia, a partir dos quais é possível produzir energia renovável e hidrogênio.
LEIA TAMBÉM:
→ Mais de 75% das indústrias desenvolvem algum tipo de economia circular no País
→ Agricultura e hortas urbanas são garantias de alimentos frescos e de qualidade
Grandes fatores
Para o executivo, é preciso entender que há três grandes fatores de que ressaltam a importância de soluções que sejam verdadeiramente sustentáveis amparadas por tecnologia e um pensamento de economia circular.
“O primeiro ensinamento, que tiramos da pandemia e da Guerra na Ucrânia, é que temos uma cadeia global de suprimento de insumos, alimentos e commodities que é frágil. E a tendência de friend-shoring (estratégias de localização de operações de negócios) não é apenas real, mas necessária”, analisa.
O segundo fator, na avaliação do COO, é que o problema do destino do resíduo no Brasil (e no mundo) é gravíssimo, com consequências ambientais e financeiras, e tem muito espaço para melhoria, e a única forma de fazer isso é a partir da tecnologia.
“Para se ter uma ideia do problema, pelo menos 75% das emissões da indústria de saneamento vêm dos aterros sanitários que, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), é para onde cerca de 58% do lixo urbano brasileiro é destinado. No Sul e Sudeste este número é ainda maior”, alerta.
Há, ainda, um terceiro fator, o custo da energia. “Ter energia limpa e acessível é um dos grandes desafios globais para 2030, mas as soluções tomadas até agora só pioraram a situação, a exemplo da Alemanha, que está até perdendo sua competitividade industrial, em especial por causa do alto custo da energia”, comenta Piccinini.
“Nossa solução tem um excelente custo-benefício, é mais barata que a maioria das soluções apresentadas globalmente, além de ser executada mais rapidamente. É escalável globalmente, pode ser facilmente implementada na infraestrutura atual das cidades e gera resultados rápidos”, destaca.
“Acredito que Biogenix pode ser a principal parceira para compensação das emissões de CO2eq da indústria de saneamento. Nesse sentido, chamamos a atenção de uma das maiores indústrias de saneamento brasileiras nesse quesito e estamos em tratativas e trocas de tecnologias”, adianta.
Problemas
Na questão do sequestro de carbono, o executivo enxerga dois grandes problemas. “Um deles é relacionado às soluções oferecidas globalmente, que são muito caras e levam muito tempo para gerarem resultados, além disso, poucas podem ser implementadas na infraestrutura atual das cidades e quase nenhuma possui capacidade real de escala”, argumenta.
O outro problema, na avaliação do especialista, é o ‘submercado’ do sequestro de carbono, o de crédito de carbono, que gera crédito no Brasil para manter florestas de pé, o que, para ele, é ótimo, mas é muito limitado.
“Temos tantas possibilidades para melhorar este mercado e gerar mais incentivo e acreditamos que o nosso fertilizante é uma das soluções, uma vez que já temos cases no Brasil de geração de crédito de carbono para fertilizantes e adubos verdes”, cita o COO.
Outro fato que corrobora com o pensamento de Piccinini é que o Brasil, embora seja um dos maiores produtores e exportadores globais de alimentos e commodities agrícolas, ainda assim, importa 85% das suas necessidades de fertilizantes. “Isso é o nosso grande ‘calcanhar de aquiles’, e mesmo com o Plano Nacional do Fertilizante, ainda não vimos grandes mudanças ocorrerem”, reflete.
Expectativa
Para o COO da Biogenix, o problema do resíduo urbano, industrial e agroindustrial, que já foi esquecido por muito tempo, no Brasil como no mundo, está no radar global, tanto que mais e mais soluções estão surgindo, o que, para ele, é ótimo para o meio ambiente e para a empresa.
“O futuro do mercado de sustentabilidade, para o qual nós olhamos todo dia, depende de fazer com que os negócios sustentáveis sejam também rentáveis, pois é só dessa maneira que vamos conseguir atrair investimentos para o setor, afinal, é com capital que conseguiremos cumprir nossa missão de ajudar o meio ambiente”, conclui.
Para ler mais, clique em Revista A Lavoura.